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04 março 2014

o caso do violão

Acontece nas melhores famílias, já vi acontecer. Só pensei que seria só 1 caso em 1 milhão ou algo assim, mas há esse interessante fenômeno de completo desespero silencioso que nos ataca quando seguramos um violão ou instrumento musical qualquer na frente de qualquer pessoa - virtualmente ou não.

O bicho tá ali, manso no teu colo, só esperando o primeiro acorde, mas o trem não sai! É como uma paralisação geral entre a síncope e a sinapse cortex-cerebral que manda tudo pro sistema límbico e proclama: Hoje não toco não!

Tentando esmiuçar isso e mais medos advindos disso, fiquei surpresa quando descobri que Mestre Tom Zé sofreu do mesmo problema quando era mais novo, mas no caso o uso do violão era para impressionar a namoradinha ele errôneamente tentava ganhar. Oh coincidência, hein?


 A situação hilária é trágica, pois estar nos sapatos de quem empunha o violão é como ser um Quixote com um Sancho afirmando que os moinhos são mesmo gigantes, a coragem é muita, mas a mão que nos valha não presta para dar o primeiro golpe. E assim vai.

Tentei algumas vezes me forçar a fazer isso e o desastre parece seguir um padrão, minutos até horas de puro silêncio constrangedor até algo vir e me tirar o violão da mão ou simplesmente eu desistir mesmo (2ª opção sempre mais válida, melhor baixar as armas do que deixar o monstro decepar sua cabeça ainda com a espada e o escudo nas mãos). Quando há outras pessoas pra passar a vergonha comigo, ótimo, quando não há, apenas eu, toda a atenção virada pra minha pessoa: pronto, ferrou.

A querida Veronica Varlow escreveu esse post sobre como controlar a ansiedade uns dias atrás e com as dicas dela dá para se usar bastante quanto aos relatos do link aqui embaixo...



Há a questão do violão: só tive 2 violões a minha vida toda - Portman e Claire.
Antes de ter a Claire De Lafontaine (Sim, esse é o nome completo do meu violão, sim, é francês porque o bicho foi feito em Quebec, não, não sei do que você está falando quando afirma que tenho cisma com francesas...), tinha a Portman. E a Portman era desafinada de natureza, era violão barato, minha primeira, aqueles que a cada música tinha que afinar de novo e colocar braçadeira para as cordas não saírem do tom no meio da música, eu amava a Portman por aguentar muita porrada comigo, por me defender de muitas também, mas o mais principal, por me apresentar a Claire alguns anos depois. e a Claire... *insira suspiro* ela é tudo de bom, é folk, tem corpão, tem um grave awesome, me faz sentir confiante que nada nela vai sair errado, o problema está do outro lado do instrumento (Eu), logo é uma benção e uma maldição ao mesmo tempo. Ela não me desaponta, ela não desafina, ela pode ficar meses dentro do case e nada acontecer mesmo com ela, permanecendo na mesma afinação que deixei e se não for mágico, descer um tom a mais nas cordas agudas para não arrebentarem pela falta de uso.  

A questão do eu-lírico é um assunto a parte: não sou eu.
Tenho certeza disso. Se é download de algum ego meu que deixei pra trás na outra encarnação? Deve ser, porque não sou eu. Quando eu tinha coragem de me ouvir/ver em vídeos da banda que eu costumava tocar, simplesmente focava a atenção naquele serzinho metido a besta com o violão na mão e concluía: nope, não sou. Logo a situação do eu-lírico complica o estado catatônico, pois se é algo ou alguém que channeling ali quando estou no modo mais perto do violonismo, isso quer dizer que não vou conseguir fazer isso quando bem quero. Não quando eu MAIS quero!

Claire De Lafontaine <3 <3 <3
Fiz alguns testes para saber se isso ocorre em situações diversas:
1 - virtualmente demora um bocado até eu colocar todo o ego no estado inebriante do violonismo e sair tocando e esquecer que tem alguém me ouvindo do outro lado do monitor. Logo dá para haver alguma interação entre mãos e cordas, ninguém nunca reclamou de eu desafinar, já eu erro a letra até dizer chega.

2 - ao vivo com pessoas acompanhando: a timidez diminui, pois há sempre a possibilidade de alguém ali errar e ser percebido, enquanto eu erro e passo reto no olhar atento. Com certa dosagem de álcool na corrente sanguínea consigo manter uma certa dissimulação da Realidade com o eu-lírico.

3 - ao vivo sozinha, na frente de uma pessoa que me importo muito: nada. Nadica de nada. E quando sai é o subconsciente falando por mim. Parece profético. É tocar alguma música que não lembro e a pessoa entender que tem mensagem subliminar no meio, yep e tinha (Nota para mim mesma: evitar Pato Fu no futuro, tocar mais Damien Rice e The Corrs). Bêbada e desse jeito, esquece, minhas mãos preferem tocar outras cordas ao invés de ficar alisando violão.

4 - sozinha sem nenhum espectador: o eu-lírico costuma estar acostumado com o silêncio nesses momentos, tocar para mim mesma costuma ser um ótimo modo de minha ansiedade ir pra outro lugar. Sempre acreditei que a Claire me acalma só com a presença dela no meu colo e é batata: só colocar a mocinha entre meus braços e ficar tocando alguma coisinha aqui e ali e pronto, cadê a ansiedade? Foi pro Reino das Notas Perdidas. Se consigo completar uma música toda? Não, porque aí vou querer entrar no ultimate-guitar, saber como é o solo e depois ficar improvisando umas coisas nada a ver.

A maldição do 2º verso:
Sofro também da maldição do 2º verso, que me faz esquecer absolutamente TUDO após o 1º refrão e isso é totalmente relevante devido ao estado de nervosismo que me encontro após conseguir fazer tudo como esperado (Sim, eu penso nisso enquanto estou tocando, e não, durante anos tocando só para mim mesma isso ocorre sem pestanejar, é involuntário, culpo isso na minha autodidatice ferrada que me disciplinou dessa forma).

As experiências que tive com a Claire do meu lado também não foram favoráveis até então, pessoas podem ser extremamente rudes quando se trata de demonstrações artísticas públicas e não estou munida muito bem sobre isso - na escrita até consigo lidar bem, já que posso simplesmente fingir que sou outrém e retrucar sem medo de ser feliz - agora com uma vítima em madeira em minhas mãos e testemunhas ao redor? Impossível. Para pesar mais na consciência? Todas as pessoas que deram as opiniões mais ferradas possíveis com um toque de sarcasmo eram infinitamente melhores no mundo musical que minha pessoa noobie que só queria tocar música irlandesa sem ter que levar isso para o mundo dos negócios. Obrigada a todos! Vocês me fizeram mudar de ideia num piscar de olhos, tocar violão para mim tem que vir do coração, ou do plexo solar, não dos bolsos das calças ou da carteira.

Não insistirei mais, até porque o meu momento com a Claire sem espectador é algo tão íntimo que só posso sentir sozinha e com mais ninguém. O weird é tentar explicar isso para quem sabe que toco violão e me pede para tocar alguma coisa (Graças a Eru ninguém insistiu ao ponto de eu querer sair correndo em completo terror). A melhor coisa que alguém já pode me aconselhar quando o pânico sobe pelas veias dos antebraços e paralisam os dedos?
" - Então toca Perfect Drug aí, então..." - detalhe: nem o Trentonildo toca essa música ao vivo por motivos óbvios. por mais estranho que pareça (Ou até agressivo) ao ouvir isso eu desencanei bastante de muita coisa, até colecionar mais traumas pequenos vindos de outros locais.
(Anyway, o conselho continua comigo, sempre repito isso quando venho com a besteira de "Não sei o que tocar!" E hey! Até dá pra improvisar Perfect Drug em câmera lenta xD)

Já me falaram para eu não me preocupar com as pessoas e tocar o que vier na minha mente e me sentir mais confortável com isso, mas o ponto é: o trauma sempre estará lá.

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