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01 março 2015

nossos fantasmas preferem nossos sonhos

Tava demorando para ter um combo mágico de pesadelo com quem amava (posso já colocar no pretérito tão nefasto? Já está na hora mesmo?) e um sonho estendido com meu progenitor. De manhã foi o de ter perdido o Walter no meio de tantos outros gatos em um aeroporto e quem salvar o dia ser minha avó - sempre a salvadora de muitos dias de nossas vidinhas medíocres - e agora isso.

Se há algo chamado inferno astral, poderia classificar esses dias que vêm se arrastando desde a semana do dia 25 passado. A data por mais aleatória possível só me foi esclarecedora quando os pesadelos começaram no dia 26.

Pintura de José Benlliure y Gil, La Barca de Caronte, 1919 (Fonte: Generalitat Valenciana Website

A conclusão veio em um pequeno enxerto de sabedoria vinda do Sonhar: "Todos nossos fantasmas preferem visitar nossos sonhos do que aparecer em nossas vidas acordadas."

TL;DR - rambling rambling, fucking rambling porque preciso tirar isso de mim em palavras antes que fique mais uma semana remoendo coisa que não preciso.

Freud ia adorar isso. E como iria.
Postei a pintura das Fúrias (Erínias) em cima de Orestes outro dia (25), o mimimi do dia 19 não foi digerido direito e quase foi um pequeno rollercoaster de feelings na sexta. Tá tudo ficando muito uniforme ou sou eu que tou perdendo o controle? Provavelmente os dois ao mesmo tempo.

A ironia de postar Orestes - um dos meus favoritos na tragédia do teatro grego - foi de estar sendo perseguida pelas mesmas entidades formosas que nos faz arrepender pelo resto de nossas vidas por coisas que são inicialmente como aprendizagem na sua vida (Por Eru Ilúvatar, eu ainda não matei ninguém, não é possível morrer de remorso por algo abaixo disso na categoria de pecados contra o próximo). Parece que meu cérebro não está muito preparadinho para lidar com as situações do Sonhar, pois sempre acordo como se estivesse querendo sair da minha cama arrastada e ficar bem longe dela por um bom tempo.

Mas o sono persiste. Ótimo, como se já não lidasse com isso desde sempre.

Orestes, que matou a mãe e tio ao ser alimentado pela vingança da irmã mais velha Elektra e por não ter as informações suficientes sobre a situação toda da Casa de Atreu, encaixa tão direitinho na análise minuciosa que faço da vida emocional aqui que morro de rir ao pensar que talvez o mesmo Mal esteja pairando na família Morgan.

Minha irmã tem essa ideia meio estranha sobre haver uma maldição na família quando o assunto é vida amorosa, relacionamentos duradouros, casamento e tudo mais. Completamente compreensível devido ao histórico dela, mas o meu tá ficando alarmantemente parecido com o fantasma que me persegue faz uns 17 anos: a figura paterna nula do meu progenitor.

O sonho estendido me deu uma reunião de família com muita gente que não conhecia, uma festa à parte em um lugar que pra mim sempre será meu santuário primário (os fundos da casa com a mangueira sem frutos) e a presença dele para encarar cedo ou tarde. Tarde, pois passei boa parte do sonho enrolando em um quarto, me arrumando para alguém que nem sabia quem era (E pelo jeito devia ser alguém muito muito importante, porque até de vestido tive que ir) e tentando maquinar o tipo de introdução de conversa que poderia ter com ele. Havia dois tios meus que iriam ajudar nisso - parecia programado o encontro, a conversa - um deles sempre me foi receptivo, amável e chegado as minhas ideias malucas, já o outro é como um avô pra mim - pois ironicamente é isso que ele acabou se tornando durante esses anos, sem a parte feia de maltratar a esposa. O vestido estava fora do padrão, eu parecia mais velha no espelho, os sapatos me eram apertados. 

Por um momento deliberando entre querer mesmo falar com ele ou não, um casal de indianos entra no quarto para trocar as roupas de seus filhos - a festa era enorme, tinha muita gente e muitos quartos na tal da casa, e as paredes eram irritantemente brancas. Todas elas.

O marido me conhecia de algum lugar da UFSC e me perguntou sobre o início das aulas e porque de estar ali na festa - ao que deu para entender, não era pra eu estar ali, não fazia parte daquilo tudo - tentei responder alguma coisa, mas fiquei ansiosa em ajudar a mulher com uma criança (Eram várias e parecia ter mais lá no corredor esperando) e as roupinhas sujas de bolo. Assim como qualquer mulher que vejo em sonhos, essa não recordo o rosto direito, apenas grandes olhos claros. Cheguei a perguntar se eles eram felizes e recebi um morno "Sim, claro", mas logo entendi que eles não haviam entendido minha pergunta no senso de felicidade matrimonial ou felicidade ali naquele local. Resolvi sair do quarto após ajudar a criança - um garotinho que me afeiçoei depois durante o sonho todo por gostar de Star Wars e saber falar outro idioma que eu sabia (Mas não fazia ideia do que era, óbvio) - e enfrentar a questão.

A festa era num local enorme (No qual já sonhei uma vez no dia 12 de janeiro) com muita, mas muita gente, não tinha como estabelecer que tipo de festa era, pois caramba, era muito diversificada! o desconforto de estar com um vestido social e preto, sapatos apertados foi subindo, a minha ansiedade se aliou a irritabilidade já bem conhecida de minha rudeza querida, encontrei algumas pessoas de outros tempos, vi alguns amigos de infância (Mas não cheguei perto devido o senso de urgência) e me deparo com um grupo de pessoas que pelo jeito estabeleceram o ultimato do título desse post. Os fantasmas, todos eles, ali juntos, apenas esperando em uma barraquinha.

Os fantasmas estavam em paz aparente (Oh sortudos são vocês, todos vocês em suas particularidades!), sorridentes, maravilhados com a festa. Um adicional de angst pessoal foi bem selecionado, pois uma pessoa que preferia não ver pro resto da minha vida de escriba (E pasmem tinha aparecido no sonho de começo dessa manhã, mas com outro assunto e outra atitude) estava entre elas. E hooray, tudo que eu não tinha no estômago, quis jogar fora. Aí percebi o quanto estava com fome.

De comida, tá?

Andar por ali era horrível com os sapatos apertados e fui investigar porque havia escolhido esses, a minha meia arrastão também não ajudou muito em poder entender o vestuário de uma cor só. Um dos tios gente boa me encontrou, conversou um pouco comigo sobre coisas bobas e me fez uma pergunta embaraçosa sobre a tal pessoa lá no grupinho de fantasmas. Pelo jeito eles também faziam ideia de como é ter essa nuvem de culpabilidade pairando em cima de sua cabeça, mesmo sendo um puta de um exagero formalizado pela capacidade única e inútil de pensar demais. talvez seja essa a nossa maldição: pensar demais.

(Ou provavelmente um antepassado meu deve ter matado algum filho de um figurão do Olimpo também...)

Chego em uma parte de uma outra casa no mesmo terreno onde está acontecendo a festa cheia de gente e do nada já sinto minha barriga reclamar por comida. e eu sento a mesa oferecida e encho meu prato, e verifico o que tem para beber e não olho nenhuma vez para aquele que deve ser a fonte maior de preocupação desses tempos. Sei que ele está ali, sei que ele espera que eu fale, mas o meu orgulho tá em alta desde começo de fevereiro, a cotação entre Orgulho/Hýbris e Amor Próprio está oscilando desde então. 

Ele comenta sobre o fato de eu estar mais alta, mais adulta, eu retruco que se ele estivesse por perto teria nem percebido que continuo tendo os mesmo 1,68m de quando ele foi embora. Ele pergunta o porquê da Biblioteconomia, eu aponto o garfo para ele e apenas balanço o talher como se fosse algo que eu gostasse muito de segurar (Principalmente para afligir ferimentos mortais em pessoas que fazem perguntas como essa), expliquei que às vezes a gente nasce para uma coisa e não encontra a vida toda. Aí quando encontra não tem como explicar o porquê estar fazendo tal coisa.

O tio parecido com avô pediu que eu o tratasse com respeito porque ele veio de longe me ver, o sarcasmo aumentou ali, já que comentei rancorosamente que ele parecia me evitar o máximo possível sem dar chance de eu ter uma conversa decente com ele. Estranhamente não mencionamos a figura de minha mãe em nenhum momento do diálogo, sério. Em nenhum. Ele perguntou dos meus fantasmas lá fora, eu dei de ombros, enxotando qualquer sentimento ruim que estivesse subindo pela minha garganta e me fazendo arrepender de ter colocado doce junto com a comida (Powha a comida tava MUITO BOA, sério! Posso descrever o cardápio da mesa aqui, mas vai estender MAIS o que está sendo esse sonho).

Eu não sei o que os fantasmas fazem tanto nos meus sonhos. Creio que eles sabem muito bem que é o único local em que me sinto segura verdadeiramente em fazer qualquer decisão sem temer as consequências, por mais mínimas que sejam (Porque eu morro de medo das consequências de meus atos, bons ou ruins). Eles sabem disso na vida real, cada um deles soube de pedacinhos meus que só divido com quem amo verdadeiramente e vai ver que é essa a real maldição: o de dar pedacinhos para quem se ama, pois obviamente se dar por completo é ilogicamente possível. Agora? Mesmo agora? É algo proibido, como uma daquelas restrições que a gente se auto-impõe para não se ferrar demais. Ninguém precisa de tudo quando se pode ter um pedacinho que aprecia, então que seja assim.

(Até porque a minha percepção de todos esses fantasmas é a mesma. Sem exceção. Pedacinhos que me foram oferecidos, pedacinhos que esperei que virassem um quadro completo, mas devido a meus erros e aos erros deles acabou sendo só pedacinhos. e essa é a metáfora para a vida amorosa de minha pessoa, yey!)

O progenitor decidiu me falar o que ele tava passando, como era confuso poder explicar as coisas com mais clareza, mencionei a ideia de maldição de minha irmã para ele, ele ficou calado. E eu com raiva. Muita raiva. Perguntas foram feitas, respostas vagas foram dadas, ele perguntou se eu estava feliz por ser quem eu era, disse que estava melhor que ele que era um nômade que nem digitando o nome completo no Google aparecia resultado algum (Essa sou eu sendo idiota com argumento pior ainda, mas é frustrante quando nem o CPF dele aparece nos resultados, morto ele não tá!), com essa rodada de vozes elevadas, ele ficando vermelho no jeito que costumava ficar antes de ralhar com algum grito pra nos intimidar, já me levantei na hora e pronta para sacar a primeira coisa perto para me defender.

Infelizmente essa é uma das lembranças físicas bem nítidas que tenho dele na minha infância: o de me afastar já com o pensamento em bater nele se ficasse muito agressivo. (A coragem aos 8 anos? Nenhuma. Mas a vontade estava lá, comigo debaixo da mesa) Ele tentou se acalmar, aos prantos do jeito ridiculamente Morganiano que temos de transparecer nossos excessos emocionais (Como odeio isso) e pediu para que eu o ouvisse. e eu ouvi e não foi nada esclarecedor. Entenda, minha mente estava fervendo de raiva por não saber de nada do que acontecia com ele durante anos, pela minha família manter essa bolha separada de nós, por ouvir parentes terem uma impressão totalmente diferente dele do que eu tinha em casa. Ele sempre foi atencioso e questionador quando estava conosco, mas distante e altamente fora da casinha quando saía de casa ter o alívio social dele com a bebida. Cada um faz o que pode pra não aturar a Realidade Estática, mas quando tento colocar um padrão aproximado do que ele foi cerca de 30 anos com a família e sei lá, 18 conosco acaba sendo confuso: é como se fosse uma pessoa totalmente jogada na sarjeta que decidiu dizer whatever pra vida e mandar o dedão do meio pra tudo.

Ou talvez foi coração quebrado.
(Desconfio piamente que foi coração quebrado, olha só quem está imitando o mesmo padrão?)
O garfo que estava na minha mão afundou no pedaço de alguma coisa no meu prato, ele abriu os olhos surpreso e assustado, era como se ele soubesse que tudo estava se repetindo. se fosse alguns anos atrás, seria ele batendo na mesa e jogando cadeiras por ficar irritado quando não compreendia algo ou alguém. Ele não tinha culpa por isso na época, nunca conheci verdadeiramente os pedacinhos ofertados pelo meu pai para compreender toda a indignação dele com o mundo.

(And guess what? Deve ser o mesmo motivo da minha. Perguntas sem respostas, dúvidas sem explicações. Vim pra cá pra consertar alguma coisa, não só ficar observando como todo mundo faz.)

Meu tio me pediu respeito de novo porque tinha mais gente na mesa - não vi mais ninguém a não ser ele, o tio gente boa e meu pai, então entrei em pânico porque se isso era um sonho, se realmente essa festa era parecida com aquela que tive antes no dia 12 de janeiro é porque havia mais gente me olhando, me julgando, me alimentando para os fantasmas ficarem mais nítidos em meus sonhos. Aquietei o facho, apreciei meu suco de uva, enchi até a borda por mais, esperei alguma manifestação seja lá de quem estava na mesa. Lembrei na hora de um pedido inusitado que fiz ano passado em meados de julho sobre querer desesperadamente controlar a minha hýbris, o meu orgulho desmedido contra os deuses, para evitar mais karma na minha sacolinha. Ainda ouvi o tio parecido com avô dizendo que "Todos nossos fantasmas preferem visitar nossos sonhos do que aparecer em nossas vidas acordadas." e tive que concordar com a frase tão fora do contexto da conversa na hora, mas que fazia total sentido em tudo que havia se passado.

Com o clima pesado terminei minha refeição, levantei, pedi para o meu pai vir comigo caminhar e podermos falar qualquer coisa, o que fosse. E assim fomos pela festa, dessa vez eu me preocupando mais se conseguiria andar com aqueles sapatos horríveis, se saberia onde andar sem encontrar os fantasmas, o casal indiano cheio de filhos apareceu nesse meio tempo, o filhinho que fiz amizade me puxou para brincar de lutinha com espada de espuma com ele, recusei, estava de vestido.

Estava, não quando olhei para baixo. Eram roupas normais de sempre, ufa.
(Dificilmente sonho que estou pelada, apesar que de manhã... ahem, esquece o sonho de manhã...)

Enquanto estava brincando com a criança, meu pai se misturando na festa, sem mais fantasmas me olhando, apenas eu e o garotinho indiano disputando quem seria o melhor Jedi da lutinha. Depois de algumas rodadas de brincadeira, sentei no chão e não senti tão revoltada assim, nem tão satisfeita assim. Havia muita coisa para perguntar pro velho, muita coisa que me incomoda seriamente, mas talvez nem seja mais minha missão trazer algum tipo de colaboração pra ajudar o camarada. Talvez nunca foi missão alguma, talvez eu tenha enfiado na cabeça que preciso salvá-lo antes de algo pior acontecer (Ele morrer, eu morrer).

Complexo de Messias, devia ter ido fazer Medicina ou Psicologia.
Talvez seja o coração quebrado.
De nós dois.

Acordei fula da vida, chorando, quase atropelando o Walter no caminho para o banheiro (Coitadinho, ele tava enrolado no meu travesseiro num sono gostoso). O sonho muito vívido na cachola, o gosto amargo de rever os fantasmas e querer apenas cavar um buraco e me enfiar lá dentro e sair jamais.

Mas essa sou eu pensando demais novamente.
(E essa sou eu de mau humor do baraleo torcendo muito para não dormir tão cedo e quando fizer isso cair em sono profundo e não sonhar com mais powha nenhuma.)

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