Pesquisar este blog

17 maio 2015

15 anos de pura beeeeshice

E a única coisa que passa na minha cabeça nesse dia é aquele episódio de South Park em que o Tom Cruise entra no armário do Stan e...


Graças a Eru que já saí do meu há 15 anos atrás.


Sair do armário é um conceito diferente para cada um que passa por essa experiência. Há quem saia e já vai soltando a franga, há quem saia e deixe a porta aberta para poder entrar de novo, há também aqueles que são tão sortudos que nem armário tinham.

Eu fui entre o criar o armário e manter a porta aberta pra fugir pra lá quando dava.
Bicha de quarto escuro não dura pra sempre.

Desde criança percebo que tem alguma coisa diferente no meu olhar com o sexo oposto e o mesmo sexo. Morro de medo de meninas, vejo meninos como portas de madeira. Tenho um apreço especial pela anatomia feminina, entendo os homens como algo extremamente chato de se apalpar.

A veia científica para explicar o que eu não sabia veio cedo, desde comparar o fisiológico de um com o outro e perguntar a ambos lados qual era a diferença. Infelizmente minhas investigações de criança não foram bem conclusivas, mas mesmo assim: morria de medo de meninas (E do meu corpo e como ele se comportava quando via outras meninas).

A coisa foi ficando mais estranha quando tive o primeiro beijo - com uma garota - e achar que sim, aquilo era válido. O mais louco disso tudo foi que por conviver com homens e meninos na maior parte do tempo, eu achava que tinha os mesmos direitos e deveres que eles, pura ilusão, aiai.

Quando digo isso, é que minha noção de educação e respeito veio muito do cavalheirismo que me ensinavam - yep, puro machismo, eu sei, mas eu tinha que me basear em alguma coisa - logo perceber mais nas meninas se tornou um problema pra mim. Muitas vezes fui chamada de sapatão e outros nomes piores quando nem sabia o que era isso, eu praticava esportes com muito mais alegria que muitas meninas (Futebol e basquete foram os principais), muitas vezes eu era o "papai" na brincadeira de casinha, muitas vezes era confundida com um garoto por não ter o porte físico feminino até meus 17 pra 18 anos. A puberdade não foi tardia, mas também um tiquinho cruel na distinção de formas.

Por achar que tinha os mesmos direitos e deveres de um cavalheiro (Sim, era esse o termo, ser educada como um gentleman, não como uma dama) fui construindo uma porção de códigos de conduta pra me adequar ao meu corpo e ao corpo dos outros. Foda foi entender que pela normativa padrão, o meu corpo deveria era se adequar para chamar atenção dos meninos, não das meninas. A frustração começou ali. Nunca tive "aquela conversa" com meus pais. A explicação para as coisas que eu tava sentindo? Não lembro, se houve, não foi explicativa demais pra eu compreender a enrascada que tava me metendo.

Nos livros encontrei as respostas biológicas pra muita coisa, muito mais tarde fui saber do ciclo e como funcionava direitinho - daí minha mania de saber os dias corretos a cada mês - mas nunca assim alguém me dizendo wtf era essa bolha de hormônios latente debaixo do meu diafragma, ao lado do meu baço. Depois dos 14 é que beijei um cara e na hora percebi que tava faltando alguma coisa. Urrum, alguma coisa em cima, tipo: peitos. Foi assustador, porque nunca fui de perceber no corpo (Até negava o meu como sendo o meu).

A frustração de antes juntou com essa, a noção de que NÃO SE PODE ter peitos quando você também tem peitos. Não importa o quanto seus sonhos à noite te dão certeza que é bom, ´eótimo, é gostoso ter o corpo de alguém do mesmo sexo e não do sexo oposto. Really? Eu me sentia um peixe fora d'água. Tirando o fato da cidade onde ue morava era uma roça atrasada, conversar isso com alguém era impossível.

Aí ferrou quando me apaixonei pela primeira vez aos 13 anos.
(Aliás a data de hoje é o dia exato em que me dei conta que não era admiração, era paixonite aguda)

Aí tive que construir meu armário. De ferro maciço, com trancas por dentro, sem buracos de ventilação, na cor verde musgo de preferência. Me tranquei nele e só fui sair aos 18 quando consegui ter a coragem de falar com alguém sobre isso. Uma de minhas inseguranças também se relaciona ao meu corpo, há coisas nele que ainda não compreendi por completo, ou tive a chance de me fazer compreender melhor. 

Pra família foi subentendido, só vim a falar com a minha mãe quando estava com 21 anos - e ganhei alguns anos de pura negação vindo dela, yeeeeey maravilha - e minha irmã só uns 4 anos atrás. O processo me foi lento, o armário tava ali pra me acomodar quando tivesse que disfarçar a beeeeeshice latente (Porque sou muito drag quando tou atacada). De uns tempos pra cá que deu para me afirmar como homossexual e saber os meus limites (Apesar de estar testando alguns limites ainda).



Durante todo esse caminho dos 13 aos 24 anos fiquei no vai e volta de entrar e sair, pra me resguardar do que viesse (Até porque não haveria como lidar com isso sem uma diretiva de segurança e confiável), hoje me sinto bem mais confortável comigo mesma do que há 10 anos atrás. Hoje posso apreciar o que estou sentindo fisiológicamente sem receio, medo, culpa, preocupação alguma (Tudo bem que me foi plantada uma sementinha odiosa de não estar segura com alguns aspectos de minha sexualidade, mas tou arrancando essa erva daninha), finalmente posso admirar os quadris de uma mulher e me certificar que eles são perfeitos.
(Eu sei, é coisa minha, adoro ossos da bacia que encaixem perfeitamente para fazer... ahn... deixa pra lá...)

E eu gosto do sexo, é perfeito! É lento, é criativo, é turbulento e confuso ao mesmo tempo e o corpo feminino é tão engenhosamente magnífico que as opções de se conseguir prazer são tantas que não tem como eu querer ficar com um cara. Eles são portas de madeira com uma maçaneta incomum, não gosto de agarrar portas... Mulheres são bem mais enigmáticas no sentido corporal do que os homens, não vale só encostar em algum lugar específico e pronto, é todo um caminho de descobertas de sentidos que faz toda a diferença.

Meu armário imaginário não existe mais, mas mantenho uma política de "se não perguntar, não digo" com as pessoas. Essa nossa sociedade não está preparada para respeitar o corpo do outro. E definitivamente, ninguém paga as minhas contas agora, posso fazer o que bem entender da minha vida, né?

*suspirão*

Estranho rever o post e perceber que apenas falei do aspecto carnal de sair do armário... É que psicológicamente eu já sabia que era diferente, racionalmente isso não parecia certo, socialmente fui repreendida mais do que esperava. Mas bem, sobrevivi e viva o dia bonito em que saí do armário!

Nenhum comentário:

Postar um comentário