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31 agosto 2020

virei um jakalope

De acordo com algumas argumentações de pessoas feministas que excluem pessoas trans a.k.a. TERFs - criaturas nada mitológicas e imaginárias que infestam os cantos de nossos convívios e são um perigo constante com suas ideias beirando a supremacia branca e fascismo, muito legal isso dentro do feminismo - quando uma campanha de marketing de empresa de coletores menstruais decide usar o termo "pessoas com útero" está automaticamente excluindo "mulheres de verdade".

Porque também de acordo com essas mesmas pessoas, "mulheres de verdade" se reduzem ao fator terem útero e menstruarem com esse útero. Realmente não dá para entender qual o ponto, afinal.

Então eu, assim como milhares de outras pessoas nesse Brasil - que tem problemas uterinos e que podem ou não ter tirado esse complexo cisteminha de hormônios ensacado entre os rins de um corpo denominado "mulher de verdade" - estamos em um mundo paralelo ao mundo real delas.

Bem, sempre acreditei nisso desde criança, que algumas coisas bizarras que aconteciam no mundo real, dominado pela cultura hegemônica cisnormativa patriarcal, iria criar uma realidade alternativa para as pessoas que não se encaixassem na descrição do cenário. De vez em quando dá para tatear essa realidade alternativa, nesses últimos meses tenho feito essa peregrinação nessas terras, é um lugar seguro e sólido. Quero ficar por aqui para sempre.

Mas voltando a argumentação das "mulheres de verdade"... Se eu não uso mais meu útero ou menstruo mais - e realmente não irei mais - logo não existo. Ou existo nesse mundo paralelo onde as pessoas cis, infelizmente as mulheres cis em sua grande maioria, vão clamar que não sou alguém apto para habitar o mesmo espaço-tempo que elas. Algumas irão ser radicais e dizer que mereço morrer ou levar um estupro corretivo para "voltar" a ser "mulher de verdade" (então esse conceito adiciona punição humilhante ao corpo para ser aceito na realidade onde elas vivem... Hmmmmmm, será que é em algum lugar do medievo, talvez antes das inquisições, ou sei lá). Realmente é difícil de entender como essas "mulheres de verdade" constroem argumentos para viverem...

Esse é um Jakalope. E é da animação Pular da Pixar (2003)

Mas como sou pacifista (trouxa e frouxa) e não gosto de ver ninguém brigando, ainda mais se for com úteros de outrem (o meu deixa em paz que ele já causou danos perigosos), decidi que sou um jackalope.

Eu poderia escolher qualquer animal mítico do folclore brasileiro, sinceramente, boitatá pra mim sempre foi incrível, mas não encontro nenhum que denote a questão de transição a não ser esse coelho rombudo com chifres de veado e que tem propriedades alucinógenas ao ser visto. O chifres de veado foi tudo na minha escolha, adoro. 

Logo como jackalope devo dizer que o mundo dessas feministas radicais parece ser um lugar bem ruim de se habitar com tanto rancor, mágoa e ódio destilado pelas suas bocas, quando se era necessário um movimento contrário contra quem as oprime. Opa, nos oprime. Nos oprime? Não sei se o patriarcado violenta jackalopes - talvez sim, talvez não - mas ser solidário à luta também é essencial para demonstrar empatia, né?

Mesmo que seja TERFS tratando pessoas não-bináries e homens trans como lixo por conta de uma propaganda de coletor de menstruação. O sagrado feminino tá aí, namastê, para nos condenar, nós, milhares de unicórnios/jackalopes com útero, mas não condizendo a expectativa da fêmea fértil. Para todas as mulheres de verdade que então sofreram com câncer de colo, HPV, e outras doenças, para as que chegaram na menopausa, corpos estranhos habitando esse conceito de "mulher de verdade" com útero funcional para reprodução.

O meu já foi pro saco, controlado quimicamente agora e engoliu alguns meses da minha vida, me fazendo rever todas as opções que eu tinha para me manter nessa realidade. Tirou algumas esperanças também, abriu um ralo sem fundo para três pacotes de transfusão que me assustaram pra caramba (eu desejei intensamente que fosse alucinação, não foi) - então para esse complexo sisteminha de caldeirão hormonal que não mais funciona direito conforme as normas tácitas de uma convenção anciã de "mulheres de verdade" (e que excluem pessoas trans, ah vamos chamar de TERF mesmo, porque eufemismo é pra se gastar em ironia, não em apontar os dedos pra quem nos mata), eu sou uma pessoa inválida.




Logo jakalope. 
Olha só como ele é fofinho. 
E veadíssimo.

Prefiro assim do que passar vergonha em rede social destilando discurso de ódio, coisa mais péssima isso não direcionar a raiva pro capitalismo, tsc tsc. 

16 julho 2016

as particularidades discursivas

Aqui na Biblioteconomia ando pensando umas discussões muito boas entre lados políticos de diversas facetas. Tem de tudo ali. Estar engajada no centro acadêmico traz uma bagagem enorme de tato tácito entre as pessoas, até porque você vai passar anos com essas pessoas pelos corredores e criar desavenças por opiniões diferentes não faz de ninguém melhor.

Como estou nessa caminhada de autoafirmação de certa forma apenas na teoria (até então não encontrei ninguém não-binárix pra trocar uma idéia ao vivo e comprovar teorias que meu interior entende como visão de mundo, mas que talvez para outra pessoa seja completamente diferente.

A maldição tá na linguagem, seja qual ela for.

Então há essa pessoa muito muito muito linda e batalhadora e situacionalmente vulnerável a uma porção de emparelhamentos sociais, mas que não perde a voz em momento algum para expressar sua vivência, seu posicionamento e o mais importante: sua mulheridade.

Essa é a forma como ela usa o termo. E eu acho incrivelmente encantador como alguém que desafia qualquer possibilidade costumeira do status quo ao se empoderar da linguagem na linguagem para desconstruir a linguagem.

Complicado né?

Pois é assim que me sinto quando vejo/ouço a linda pessoa. Ela me fascina pelo fato de saber seu posicionamento e espaço na sociedade, usar essa problemática que permeia e influencia a vida dela todo o santo dia e transforma em discurso ativo, questionador e de certa forma aquele tapa na cara que muitos precisam.

Adoro conversar com a M. Z. por isso, ela me mostra que não importa o quanto nós tentemos nos expressar, seja qual for nossa vivência, regras de vida, óticas de vida, tudo, absolutamente tudo há uma forma de se reafirmar como sujeito e se empoderar através de ações ou através do Discurso.

A discussão em questão era sobre as teorias do feminismo radical, da teoria transgênero e a posição dx travesti nessas formações discursivas. Ela e a M. mantiveram um debate que achei essencial presenciar pro resto de minha vida, até para me entender onde encaixar o meu posicionamento quando indagada sobre as escolhas lexicais, formas de ver a questão de gênero, a fluidez entre um conceito e outro. Bem, descobri que posso não ser bem aceita entre muitas ramificações do Feminismo por simplesmente decidir que o binarismo de gênero (feminino e masculino) não seja ideal para a minha visão de mundo, de enxergar a realidade em que me insiro, que toda a construção identitária que sofremos desde pequenxs para satisfazer uma vontade da ideologia dominante (cis gênero, branca, de raiz lá nos processos de dominação do corpo e de como tratar o corpo do Outro - e isso vai dar um problemão de tentar exprimir teoricamente, pois eu me encontro inserida nisso, enquadrada nessa ótica de visão de mundo binário AND sou considerada branca, classe média, que usufruo de privilégios estabelecidos por um sistema defeituoso e altamente coercitivo, e que NÃO JAMAIS DEVO usar a minha fala/discurso nessa posição em que ocupo socialmente para reafirmar direitos de grupos que não tenho como ter fala. Eu não vivencio a mesma realidade desses grupos, não posso silenciar ou rasurar o que eles dão voz só por conta desse privilégio. Viu como o buraco é BEEEEEEM mais fundo quando se analisa o discurso do Outro?).

O meu posicionamento sobre o Feminismo é o mais geral que consigo deliberar: igualdade, coexistência e respeito entre todxs. Vejo/ouço os desdobramentos desse discurso nas vocês de amigues de curso e diversas pessoas, apesar de haver convergência entre eles, há também a forma mais primitiva de se entender o mundo: a separando ao categorizar.

Aí que a cova começa a ser cavada, pois se o discurso transparece as posições de sujeito e assujeitamento que certas escolhas ideológicas que estão ali e não posso fazer nada para apagar, rasurar, mascarar quando o Outro vê/ouve, cumé que vou não me categorizar em coisa alguma ao abdicar da categorização?!

Viu porque cheguei a esse ponto da minha vida em assistir um debate caloroso sobre teorias que em tese deveriam estar ressoando de forma harmoniosa por professarem (e a escolha lexical aqui em colocando o verbo professorar foi intencional) a mesma igualdade, a mesma coexistência, a mesma forma de ver o Outro - ou antagonizar o que prejudica a esse discurso acontecer, o machismo, o patriarcado, a opressão capitalista, a desigualdade social que o sistema produz e reproduz - se esvair quando se toca na categorização de gênero e de formulação de se enxergar o corpo, e tudo ali embutido?

Em outras palavras, voltamos ao eterno embate maldito perpetuado na Idade Média: o meu corpo não me pertence, pertence ou ao Estado, ou a Deus, ou a Medicina, ou a Ciência, ou ao Outro cuidar.
Essa powha é tão bem construída em se manter escondida entre as entrelinhas de discursos que vemos/ouvimos o tempo todo que as categorizações ficam difíceis de serem desconstruídas depois de um tempo.

Cumé que vou tentar explicar a uma travesti ou a uma feminista radical que a forma de ver o mundo onde me encontro e me insiro não é o mesmo que elas constroem para si mesmas?

Primeiramente #ForaTemer e segundamente, não É MEU DEVER explicar coisa alguma, o máximo que posso fazer é demonstrar meu posicionamento de sujeito em que me encontro, esperar a reação, dialogar conforme der para dialogar e ter respeito e maturidade o suficiente em compreender que as 2 colocações da discussão podem ou não estar certas, podem ou não serem válidas, podem ou não reafirmarem a minha opinião sobre gênero (mero construto social pra denotar posição de dominante e dominador, tudo auxiliado e embasado na linguagem).

O mais foda disso tudo foi ouvir as opiniões com um sorriso de criança curiosa que me senti na hora, coração na garganta, mil ideias na cabeça, e receber um sincero: "A gente se respeita acima de tudo e isso é o que rege essa conversa". Sabe o quanto isso é incrível de ouvir quando se já tem uma normativa na cabeça professorando (e usando o verbo novamente) que o encaixe, a categorização não vai te aceitar?

Eu achei o máximo. Tanto que vim escrevendo esse texto dentro do busão, e não fui gentil o suficiente para dizer a outra pessoa linda o quanto ela estava de tirar o fôlego e fazer o meu ritmo cardíaco aumentar consideravelmente. Tudo uma questão de tato tácito.

Essa é a vida na Biblioteconomia, gente. 4 anos pra organizar estante, ser chamado de bibliotectomista em audiência pública por deputado e ter a melhor conversa épica que pude testemunhar nesses anos todos de vida acadêmica.


08 abril 2013

Feminismo nos Primórdios da Literatura Ocidental?

Então estava a ler alguns artigos bons do Blog da Cleonice Machado - a mocinha mais übber-awesome que encontrei em minha Graduação, atleticana ferrenha, defensora dos frascos e comprimidos e maluca pelo Universo Potteriano - Livros Legendados, e tenho minha atenção prendida por esse texto sobre o Feminismo e suas repercussões em discussões com pessoas que não entendem bem o conceito. Eu, como sempre, gosto de relativizar as opiniões da tia Cléo, ela pode ser deveras beeeeeem extremista em certos assuntos, mas por incrível que pareça, quando o tópico é Feminismo, ela acalma o gênio forte e te dá um glimpse da sabedoria milenar.

O que é bom quando você tem a política restrita de se manter sempre em cima do muro para poder observar bem o mundo estranho que se configura na nossa frente. Eu não sabia tanto sobre o Feminismo, mas de certa forma apoio a base do conceito igualitário que é promovido, aí a ficha caiu para uma coisinha interessante: Helena de Tróia.

Yeah, yeah, sim, sou Homero's whore, amo tragédia clássica e tou sempre atrás de fanfiction (ops) outros textos da Mitologia Grega (principalmente), então não é difícil eu acabar linkando TUDO que leio com os clássicos. Poderia ser pior, tem gente que ama Shakespeare até o tutano e ninguém reclama deles. No caso da tia Cléo, ela ama Machadão, e mesmo com meu desgosto, nunca reclamei dela por isso (Okaaaay já trollei com o negócio da batata!). Mas voltando: Helena foi a primeira feminista no começo da Literatura Ocidental?