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11 novembro 2017

Eu sonho vidas inteiras de vez em quando

Post levemente patrocinado pela playlist da Sofrência da Alma Torturada que é até bonitinha com umas músicas dos anos 80 que dá pra rir.



Há alguns sonhos que me deixam esgotade quando acordo.

Quando há detalhes demais para absorver, lembrar sem querer, conectar pontos, relaxar no sono e curtir o REM. Nope. Esses sonhos geralmente tomam parte de todo um tempo que não consigo medir exatamente em horas reais, mas que lá, no Mundo Onírico me toma quase uma vida toda. Urrum.

Eu sonho vidas inteiras de vez em quando.

Debaixo do link, mais uma daquelas filosofações após ter sonhos estranhos com detalhes.

Quando criança isso pode ser o máximo em aproveitar toda capacidade lúdica de aprender coisas. De acordar feliz depois e inventar outras possibilidades que o sonho te deu. Uma certa vez, antes ir morar no brejo vilarejo sonhei com uma viagem inteira para um lugar com muita grama e chovia pra caramba. E pessoas falavam outra língua que eu não entendia bem, devia ter uns 9 anos ali. E pareceu ser sonho de uma noite inteira - o que pro meu subconsciente foi como uma vida inteira já nitidamente tenho essa imagem de uma ruazinha de pedra molhada, eu de guarda-chuva e com voz de vovó coroca enquanto falava com alguém do meu lado. 

Nas raras vezes que acontecia na adolescência me rendia boas histórias para escrever. Saíram duas, uma engavetada e possivelmente incinerada daqui algum futuro, são mais de 400 páginas feitas à lápis e já desmanchando com o tempo.

Aí a gente cresce e entende que no mundo real estático não tem tempo pro cérebro pensar em sonhos de vida inteira. E aconteceu algumas vezes. Da última vez foi essa história comprida aí que cês podem acessar aí do lado - Projeto Feéricos - em que uma noite inteira sendo a pessoa fazendo piadas insistentes sobre caçar pokemons com um grupo de fadas rendeu aventuras dentro de uma cidade muito parecida com Chicago/Florianópolis/Rio de Janeiro. E rendeu como uma vida inteira, pois vi muito daquele sonho como ganchos de outros contos que posto aqui e yey! Alimentar a criatividade é algo incrível nesses casos! Algum dia talvez me sirva para sei lá, um livro infantil, uma série infanto-juvenil, um seriado na HBO (insira riso aqui, padrão HBO, caraca!).

Mas tem sonhos como o de hoje que me derrubam ao acordar aqui, nesse mundo concreto.

Sonho com uma vida inteira que poderia ser (maldito verbo no pretérito-mais-que-perfeito!), mas que por forças externas não serão. Porque não é pra ser. É a constatação do 2 + 2 = 5 da sala 101 no final de 1984, sabe? Não adianta o que a tua mão está indicando visualmente que é 4, Winston, o Partido diz que é 5, então é 5. E olha, pra provar pra você que realmente não é legal ir contra o Partido: vou quebrar o seu dedão e cada dedo da mão se você insistir nesse pensamento-crime.

Tá, não tão dramático, não houve dedos arrancados, mas me sinto realmente péssime ao acordar após sonhos assim. Porque dispersa uma energia que eu deveria estar armazenando pra atarefas diárias, inventando novas tr0llices, fazendo meu trabalho legal, escrevendo o que gosto, tendo um tópico nonsense pra debater aqui no blog, BUT cá estou fazendo esse adendo a minha memória fraca que hey! Dá um fucking jeito de não sonhar mais desse jeito.

Por uns anos usei algumas técnicas de sonho lúcido que me ajudavam com pesadelos - tenho o que chama  de terror-noturno desde novinhe, essa de ter consciência dentro dos próprios sonhos é uma boa pra lidar com certos monstrinhos debaixo da cama, dentro do armário - e foram eficientes em me dar alertas de como sair de sonhos em que eu via que iam ser dessa forma: muito parecido com a realidade concreta que aqui vivemos, com pessoas conhecidas, com a mesma rotina, com aquele futuro promissor que imaginamos uma vez e outra dentro do ônibus ou vendo algo bacana acontecer, aquele relance de "poderia ser" que todo mundo tem ao fazer prospecção em suas vidas, mesmo que seja "poderia ser que eu tivesse um sorvete de baunilha com nutella" e plim, no sonho acontece.

E dói. Porque eu não tenho visualizações de vida que "poderia ser" só com sobremesas gostosas, há muitas coisas inimagináveis e "que não vão acontecer" (colocando em aspas aqui devido ao status quo me dizer veemente que não vai acontecer. Sabe o 2 = 2 = 5? Bem isso). 

Hoje eu deixei um sonho de vida inteira seguir o baile - como a garotada fala - sem me prevenir do damage quando acordo. O meu corpo tá todo dolorido e minha mente eu SEI que vai revisitar algumas coisas do sonho por puro masoquismo básico virginiano de achar que o mundo ideal visualizado ali - ou que considero de perfeição nos meus padrões de perfeccionismo beirando o caos - e como é MUITO parecido com a rotina que eu tenho, vai doer reconstruir todas as travas de "poderia ser, vamos tentar?" para "2 + 2 = 5, dedos arrancados metaforicamente?".

Sonhei desde criança, na Tiago da Fonseca, o que poderia ter sido se não tivesse mudado de lá, quem conheceria, como seria minha educação falha, minhas amizades superficiais que se tornariam mais firmes ao entender o que raios é amor fraternal, eu teria mais tempo no recreio conversando com a tia Tony que vendia lanche e era super de boas em ensinar umas coisas sobre a vida, aprenderia sobre as filas de meninos e meninas e aprender a burlar isso com mais eficiência, eu vi isso acontecer no sonho. Vi também gente que nunca vi e que tinha minha afeição, e dali foram takes e takes do que poderia ser se não tivesse ido para Minas Gerais e arruinado uma adolescência carregando o peso das escolhas dos outros, manter uma mãe focada em ter uma âncora no final do dia e não endoidar com uma família predatória, a parte pior de tudo que me construiu nesse cinismo, ceticismo e usando sarcasmo como escudo não teria acontecido dessa forma.

Eu teria aproveitado a adolescência. Já seria um começo. E não leria Edgar Allan Poe aos 10 anos por engano.

Ainda era uma criança viada, glitter e talz, o gosto musical continuou, tanto que ao entrar em uma lojinha que minha avó paterna (coincidência 1, ela SEMPRE aparece nesses sonhos de alguma forma) e pedir para ir ao porão ver os instrumentos musicais, ela diz que tem tin whistle. Eu queria aprender essa coisinha maravilhosamente desafinada e irlandesa há muito tempo, e a ideia de retomar os estudos em música tá voltando com força, mas hey! Sonhos! O poderia ser. pro porão desci e vi quadros bem nítidos, coloridos, paisagens de mares e barcos e regiões litorâneas, espelhos decorados, essas coisinhas velhacas de roça de lugares litorâneos, eu me sentia em casa ali naquele local, chamei de "meu antigo quarto" e lá estava um violão quebrado sem cordas, uma sacola com trocentas flautas de vários tipos - até bocas de saxofone, trompete e clarinete, sei lá por que tava ali - e duas tin whistles de cores diferentes com afinação diferente (E eu sabia a afinação só de tocar, caraleooooo, que inveja de mim mesme no sonho). puxei os instrumentos pra fora, deixei em uma mesinha, aí o que o cérebro computa durante trinta e um anos e o coração não filtra de jeito algum acontece.

Sonhei com quem não queria sonhar.

Porque eu já parei de sonhar que vou encontrar alguém que não existe.
(Quanto mais negar, melhor né? Faz tão bem pra Sanidade!)
Eis o que eu já conhecia a pessoa desde criança e ela desceu pro porão - e confirmou a teoria do "meu antigo quarto" - e ficou mexendo nos quadros dizendo que queria acampar no final de semana. E a conversa foi normalzinha, porque eu estava desconfiando quem era, mas não exatamente sabendo como quem era. Eu só queria a tin whistle de afinação em Sol maior e tentar tocar desafinadamente lá fora.

Parece que a ideia de acampamento vingou, porque logo já tinha um plano inteiro de fim de semana feito e eu só no urrum, urrum, urrum, só cobrei uma lâmpada/lanterna onde eu fosse dormir, no completo escuro e silêncio sempre me apavorou, ainda mais no meio do mato. E tudo ficou certo, as bandeirolas amarelas que costumam sinalizar que "Hey! Ativa o modo sonho lúcido, porque VAI DAR RUIM!" não levantaram e fui.

Sem brincadeira foi como ter vivido aqueles dias em acampamento com a tal pessoa. E eu sentia uma angústia chata de não estar perto dela às vezes, e isso foi escalando para a adolescência em que teve flashbacks de fatos importantes (Ou relevantes nas pesquisas do meu Google subconsciente?) como o se formar, no Fundamental, mudança de escola #SddSEdithGamaRamos, talvez, talveeeeez uma promessa de "Quando eu voltar, a gente vai morar juntas" e lembro nitidamente de recusar com a cabeça pelo "juntas", eu já sabia das minhas descobertas que só fiz agora (17 anos depois), não me sentia confortável com o tratar no feminino, não sentia interesse em meninos, eu já sabia. Tava acertado. Não tive que esconder, fingir, negar, sufocar. Todo mundo sabia, e respeitavam ao seu modo, tinha oposição? Sim, até dessa própria pessoa com quem tinha uma ligação emocional muito forte, mas não quebraram meus dedos como os do Winston.

Era um mundinho bem feliz esse, hein?

E foi seguindo, até o alarme do relógio me acordar às 06h50 sei lá porquê, dar tempo de levantar no automático, beber água, ir ao banheiro, abrir a varanda pra gataiada tomar ventinho e solzinho nas fuça e voltar pra cama com as cenas do sonho printadas no lobo frontal. Fiquei um tempo navegando no Facebook e caí no sono de novo pra quê?

Pra voltar pro sonho de novo. Onde havia parado. Damn!

Aí que saquei que era sonho. A ficha caiu mesmo quando entrou na vida adulta, quando o status quo que não permite certas vivências e não deixa em paz quem não é padrão bater bem em cheio. Ali começaram as dissecações de dedos.

Se uma coisa que os episódios de terror-noturno que tinha quando criança me ensinou é que se a coisa tá muito verossímil, muito realista mesmo, desconfie. Há sempre algo. Mesmo na vida real, as performances diárias de nosso mundo são impressões de interpretações diversas. O que eu vejo não é o mesmo que você vê. Quando algo está perfeitinho demais, desconfie.
(Viver em uma família de pessoas extremamente tóxicas umas com as outras também ajudou um bocado a construir essa teoria além dos pesadelos medonhos que eu tinha quando criança)

E eu comecei a me sentir horrível por estar vivendo uma vida feliz e coerente. Eu não entendia como poderia ser possível isso acontecer com tanta pressão do status quo me forçando a me encolher no cantinho e ser só espectador. E eu estava com a pessoa, feliz, sorridente, sem problemas algum, ambas as famílias aceitando de boa, sem drama emocionais, chantagens sociais, éramos simplesmente pessoas que "estavam para acontecer mesmo de tão grudadas que eram desde criança" e ouvir aquilo de um dos parentes dela me deu o clique (Ou a bandeira amarela, agora laranja pra vermelha) e botar o pingo no i. É, mais um daqueles sonhos de vida inteira. E me convenceu até esse momento que sim era possível estar com essa pessoa mesmo com tudo que a vida reservou para relacionamentos não convencionais do padrão heteronormativo.

Era pra eu estar com aquele quentinho subindo pelo umbigo e instalando entre os pulmões (Oh Florentina de G-zuis, não sei se tu me amas, mas powha precisava escrever uma letra tão perfeita?!), ter orgulho do que conseguimos, de como chegamos ali, cada pessoa em seu jeito de crescer separadas nos modos de ter sucesso nos outros campos da vida, mas juntas afinal, o tal do "Destino" romântico, sabe?

Lembro de ter me segurado muito até o final do sonho - ou quando a Bete começou a arranhar a porta pra dar aquele recadinho felino de "POTINHO, POTÃO, RAÇÃO É A SOLUÇÃO!!" - para não estragar esse sonho. Pelo menos este não. E sério, viver quase uma vida inteira (Ou seja lá qual é o Tempo-Espaço que nossos miolos e sinapses e toda química dentro da caixa craniana decide construir) ao lado de alguém que "poderia ser" e ver que "poderia acontecer", era só ter um pouco mais de coragem, um pouco mais de vontade de ser feliz nesse campo romântico e talvez, talveeeeeez, talvez assim em uma possibilidade de 5% com margem de erro de 95%, sim "aconteceria".

Mas pretérito-mais-que-perfeito?
Esses verbos conjugados nesse tempo verbal causam mais estrago e realidades tristes do que sonhos perfeitos realizados.

Foi aí que minha energia pediu arrego, porque não tava mais aguentando imaginar que aquilo sim "poderia acontecer", e de saber que ao acordar estaria em estado péssimo de humor e corporal. Não lembro exatamente onde pedi pelamoooooor de patrão Morfeu para acordar e "me tira dessa tortura onírica, prometo fazer hora-extra lavando tapeçarias no Palácio do Sono amanhã!" (Yep negação, pulei raiva, fui pra barganha e acordei na depressão, para agora na metade do dia estar a meio caminho para aceitação.) - pronto atendimento, acordei na minha cama, almofada de unicórnio na cara, outro alarme para despertar mesmo.

Dei comida pra galera, tirei as roupas do varal, chequei emails e as tarefas acadêmicas nos post-its, arrumei a mochila para o trabalho hoje na associação que adoro participar, preparei minha roupa pra sair, requentei meu almoço, sentei aqui pra escrever enquanto comia, e a angústia do acordar do "poderia ser" aliviou em 42% (número proposital lol). É seguro dizer que ficarei em daydreaming por um tempo, e dando graças aos deuses celtas que a lição tirada desse sonho foi: voltar a estudar música parece legal. Ou pelo menos arrumar a Claire (Esse é o nome do meu violão folk há uns 6 anos) aqui, a bichinha tá com o braço quebrado faz mais de 1 ano e money pro luthier que é bão, nóis não have.

E que eu morro de medo do "poderia ser".
E de verbos no pretérito-mais-que-perfeito.

Eles já destruíram muita coisa na minha vida, pelo menos aprender com os erros parece ser o mais sensato agora né?

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