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10 julho 2020

os sem-tomas

Há coisas bem interessantes que a pandemia está me fazendo refletir intensamente - acho que todo mundo nessa pandemia - e estar de cama por conta de outra moléstia, me deu sensações extras de como rever muitos aspectos da vida.

Por exemplo a palpitação constante.
(Não leia abaixo se você não quiser ter imagens gráficas. É o que eu faço quando me sinto ruim fisicamente, eu descrevo pra ver se o mal que está assolando vai embora. Vai que dá certo)

Como perdi muito sangue nesses últimos dois meses e dezessete dias, a palpitação é algo que venho cultivado como companheira alarmista antes de desabar na cama (ela sempre traz a vertigem e a pressão baixa). Na palpitação percebi alguns problemas de coerência que ocorre entre meu sistema de regrinhas babacas para autopreservação (se não tiver, crie um, é um kit de primeiros socorros para sanidade) e aquilo que a sociedade acha que é o mais maduro e certo.

Adoro essa comparação, porque quanto mais tento me aproximar de um consenso que sou/posso ter uma maturidade emocional de boas e sensata, obviamente algo vai ocorrer para eu apelar para medidas drásticas. A palpitação tá aí fazendo um papel estupendo sobre absolutamente tudo que preciso me esconder e desaparecer antes de sofrer uma taquicardia. O que leva ao sintoma segundo que me apavorou mais que o primeiro.
(Tudo bem ter a impressão de que seu coração vai escapar pelos ouvidos e seu peito vai abrir em alguma explosão em instantes, isso é fichinha, como se já não estivesse nessa furada antes)

Aí vem os espasmos.
A palpitação passa eventualmente, quando amansada fica perene em algum canto do meu ouvido direito só na marcha moderada. Mas os espasmos?! Ah quiriduns isso é material pronto de pesadelos mais hardcore que eu tinha quando criança e adolescente.

A franquia Silent Hill acerta em cheio
Os espasmos são comuns quando se tem anemia moderada a profunda, ocorrendo nas panturrilhas e nas mãos, no meu caso os antebraços. São pequenos puxões imperceptíveis durante o dia, se estou sentada é uma pontada menor no começo da perna e calcanhar, movimentando o pé para alongar ajuda bastante o incômodo. Nas mãos é a sensação de cãibra aliada com um endurecimento dos nós dos dedos. Aí meu pânico escala sorrateiramente.

O sangue reposto precisa estar bombeando no corpo todo, mas quando se teve uma perda de cerca de 6 litros e só agora está sendo recuperado no modo conta-gotas, as extremidades são as mais prejudicadas. O sangue não chega lá direito, logo as minhas mãos ficam azuis de vez em quando. É superdivertido ver isso acontecer sem entrar em uma crise de ansiedade para piorar a situação. Graças que sem muito sangue circulando, meus estímulos corporais sobre isso também são lerdos, mas a mente continua a mil por hora dentro de uma caixa que não funciona.

Em descrição é como se todos meus pesadelos full hard de mutilação em que olho para minhas mãos e elas estão estropiadas e azuladas ou quebradas em diversos ângulos tivessem se tornado reais. Os espasmos dão o toque gentil de "Olha esse tecido ainda tá vivo, aproveita os próximos minutos! Vai doer!" e eu aproveito, coloco luva, ligo aquecedor, esquento chá, água quente fervendo e enfio a mão pra esquentar novamente. Alguns acidentes ocorreram, mas o dessa sensação subir pros antebraços tem sido um teste pra sanidade que me levou a chorar de desespero por um bom tempo.
(E chorar de desespero tem sido um fator recorrente, estou orgulhosa de mim mesma, quer dizer que tenho emoções suficientes para sentir algo tão profundo para me desesperar)

Nas pernas são os chutes involuntários em meus sonhos - que não estão nada felizes faz tempo - e é comum eu acordar do pesadelo com um espasmo na panturrilha esquerda após ter a perna decepada ou arrancada de maneira violenta no sonho - já disse que tenho sonhos muito vívidos? Pois então. Estranhamente não são monstros que as arrancam de mim, são pessoas. E sinceramente era tudo que eu NÃO PRECISAVA era ter sonhos com pessoas que adoraria sofrer uma amnésia retrógrada pra não reconhecer mais. Subconsciente é um trem fudido.

E aí vem a dor.

A panturrilha dói por horas, não importa o que coloco para aliviar, o método mais saudável de não querer realmente cortar minha perna fora IRL é deixando ela em uma posição mais alta que meu corpo deitado, mas aí o que ocorre? A palpitação vem com tudo, tentando bombear o que dá pro membro que não tá recebendo circulação. Aí o antebraço começa o turno dele.

É um ciclo sem fim. 

Na lista de pesadelos que me apavoraram tanto ao ponto de eu confundir realidade com sonho e ter crises de ansiedade pós-acordar, membros deteriorados de meu corpo esquálido estão lá no topo. É foda se livrar de uma mensagem mental tão estruturada em anos que acaba se tornando palpável em partes. Terapia não ajuda muito nesses casos.

Não cheguei aos sintomas de olhos e pele amarelados, já a palidez no tom 666 cadavérico, esqueceram de me enterrar, estou no processo para 333, as olheiras diminuíram com a medicação tomada.

Nesse momento escrevendo esse trem já fez minha palpitação diminuir e a sensação de vertigem ir embora dos ouvidos, mas me preocupo em não estar tendo uma recuperação rápida como imaginei e 14 dias em repouso é mais outra tortura que preciso aturar pra uma mente que não para quieta em momento algum.

Mas há a parte boa disso aí, estar debilitada e de cama me fez reconstruir tooooodo um mecanismo de enfrentamento que havia sido jogado no limbo desde o início: está sendo destrutivo e ofensivo, do jeito que o caos gosta. Se as pessoas ao redor estão gostando disso, não posso dizer muito, mas fazendo o que posso e devo fazer para me restabelecer fisicamente, consequências sociais que se explodam (inclusive trabalhísticos). Os efeitos psicológicos lido um dia de cada vez. Os emocionais... Pra quê isso? Só mais atrapalha do que me cura, logo não mais prioridade no se fode aí coração!

Nessa parte, não o de bombear sangue pros meus órgãos internos.
Faz seu trabalho direito né?
É só pra isso que você serve. 

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